quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Jhonny Yguison: nove anos de sofrimento


“Se o hoje não fosse essa estrada, se a noite não tivesse tanto atalho, o amanha não fosse tão distante, solidão seria nada pra você”. (Bob Dylan).

Neste sábado do dia 20 de novembro de 2010, completam nove anos em que Jhonny Yguison passou pela pior experiência de sua vida. Ele era um “flanelinha”, uma criança de apenas 12 anos desperdiçando sua infância como trabalhador de rua, ao lado das milhares de crianças que trabalham no Estado do Pará.
Jhonny esperava ansiosamente o sinal fechar, um sinal Vermelho. E ele veio. E com ele um policial militar insano.
Aquela criança não poderia imaginar que estava diante de seu último sinal vermelho. Um momento em que, mesmo contra a vontade, guarda com detalhes em sua memória.
– Fui até a um carro vermelho no qual estavam dois homens e perguntei ao motorista se poderia limpar o pára-brisa.
– “Não, não precisa, eu não tenho dinheiro” – me respondeu.
– Tudo bem tio, não se preocupe, eu limpo assim mesmo e outro dia o senhor me paga. O senhor vai me dar algum presente de natal?
– E nesse instante o “passageiro” do carro, um policial militar, disse: - “Ei moleque, queres ganhar um presente de natal?”
– Se o senhor quiser me dar eu aceito.
– Então, ele puxou um revólver e disse: “já viste uma dessa?” “Queres ganhar um presente?” E eu já desconfiado respondi: não tio, obrigado.
– E ele bateu o tambor, eu tava de frente mesmo, quando eu virei pra tentar escapar, ele deu ... Eu ouvi o barulho, gritei, senti o cheiro da pólvora e parecia que as minhas pernas voaram. Acho que nesse momento “ela” atingiu a medula.
– E aí eu caí. Começou a me dar falta de ar, as pessoas batiam na minha cara para eu não dormir. Tinha um bocado de gente, eu via as pessoas, mas pareciam de longe. Eu só pensava na minha mãe.
Jhonny caiu agonizando no asfalto quente enquanto o criminoso fugia do local, avançando o sinal que ainda estava vermelho.
A bala lhe causou um enorme estrago. Entrou por um de seus braços, atravessando seu corpo, lhe tirando um rim, o baço e um pedaço do fígado, sendo-lhe diagnosticada a paraplegia, ou seja, a incapacidade de movimentar os membros inferiores.
Portanto, de um dia para o outro, com apenas 12 anos de idade, Jhonny ficou paraplégico. E todo esforço para imaginarmos o que isso representa, será sempre insuficiente diante da dor imensa que somente ele pode sentir.
- Eu me tornei uma pessoa revoltada. Fiquei um ano sem sair de casa. Durante a noite, no silêncio, tudo parecia um pesadelo. Eu Pensava: por que eu não fui logo daqui? Ficar sofrendo assim. Eu tentei me matar com uma faca, mas a minha mãe veio por trás e segurou. Eu achava que não valia a pena viver.
Após nove anos de sua tragédia pessoal, o sofrimento parece não ter fim. Ainda hoje Jhonny sente dores que parecem eternizadas. Do Estado recebe uma pensão no valor de pouco menos que dois salários mínimos. Em 2008, no processo judicial que ingressou contra o Poder Público, firmou-se um acordo de duzentos mil reais, a serem pagos em 2009. E toda assistência médica necessária lhe deveria ser fornecida.
A indenização foi bloqueada pelo próprio Tribunal de Justiça, o tratamento médico não ocorre de forma satisfatória. Jhonny está com pedras no seu único rim, correndo risco de perdê-lo e com ele sua vida. E o policial que o mutilou continua em liberdade, agraciado por uma repugnante impunidade.
Jhonny Yguison permanece entrevado em uma cama no quarto frio e escuro de sua humilde casa. Sobrevivendo com a dor e os fantasmas que o assombram há nove anos, na companhia apenas de sua família.
Se alguém pretende ajudá-lo que seja breve, a morte ronda a vida de Jhonny. E se isso acontecer, todos nós, de alguma forma, conviveremos com nossa parcela de culpa.
Walmir Brelaz

domingo, 11 de abril de 2010

TJE suspende pagamento de R$ 5 mi em precatórios

A decisão final só ocorrerá após a Justiça ouvir todas as partes envolvidas

Desembargadora do Tribunal de Justiça do Estado do Pará (TJE), Luzia Nadja Nascimento suspendeu o pagamento dos precatórios de R$ 5 milhões, que o Governo do Estado, através da Procuradoria Geral do Estado (PGE), havia destinado em depósito na Justiça para o pagamento de 22 beneficiários, entre eles os sobreviventes do massacre de Eldorado dos Carajás e de Johnny Yguisson. O pagamento está suspenso até que as partes interessadas sejam ouvidas e a desembargadora dê a decisão final. A medida foi tomada após mandado de segurança impetrado por um grupo de beneficiários do Instituto de Gestão Previdenciária do Estado do Pará (Igeprev), que alega ter prioridade na ordem de pagamentos, entre eles váriosidosos. O mandado diz que parte do valor disponibilizado - R$ 2,9 milhões -, seria para pagamentos de precatórios de 2006, e teria sido liberada indevidamente para os destinatários previstos para 2009. Segundo o promotor de Justiça de Defesa dos Deficientes e Idosos, Waldir Macieira, a lista que a PGE havia mandado para o pagamento foi ques-tionada por beneficiários idosos, que se basearam na lei de prioridade. “O presidente do TJE, Rômulo Nunes, mandou ouvir o Ministério Público do Estado. O MP entende que os idosos têm razão e deve-se pagar cronologicamente”. Mesmo assim, o presidente manteve a determinação de pagamentos dos precatórios previstos pelo governo, dizendo que as dívidas da administração direta teriam prioridade, diferente do Igeprev, que seria da administração indireta.

PREJUDICADOS

Entre aqueles que se sentiram prejudicados, o sentimento é de revolta. Para Jhonny Yguisson, que receberia indenização de R$ 200 mil até o final do ano passado, em acordo feito em 2008, a decisão veio em péssima hora. Jhonny foi baleado por um Policial Militar em dezembro de 2001, quando trabalhava como flanelinha na avenida Pedro Álvares Cabral com Tavares Bastos e ficou paraplégico. “Já estávamos negociando uma casa adaptada para mim e estava tudo acertado para pagar com esse dinheiro”, disse. “O pobre tem que ficar se humilhando para resolver seus problemas. Eles ficam nesse embate e envolvem quem não tem nada a ver com isso. Só quero resolver a minha vida, estou cansado disso”. Parte dos sobreviventes do massacre de Eldorado dos Carajás se reuniram ontem em Belém para definir o que fazer. A princípio, eles fariam um protesto na manhã de hoje, em frente ao Tribunal, mas vão aguardar a chegada de outros mutilados e viúvas da tragédia para protestar, no dia 17 de abril, quando o massacre completará 14 anos. “Já se passou todo esse tempo e nos sentimos prejudicados. Estamos cansados de lutar”, desabafou Antônio Alves Oliveira”. O advogado do grupo e de Yguisson, Walmir Brelaz, disse que irá entrar com um agravo contra a decisão da desembargadora. “Quando ela ouvir essas pessoas, tenho certeza que a desembargadora nos dará razão. O DIÁRIO tentou falar com o Procurador-Geral do Estado, Ibraim Rocha, mas não conseguiu. Já Pojucan Tavares, advogado dos beneficiários do Igeprev, a decisão do desembargo foi justa. “Temos pessoas com doenças crônicas, paraplégicas, que estão para receber desde 1994. Não nos opomos a outros beneficiários, mas não podemos excluir as pessoas mais antigas desse pagamento”.

Diário do Pará, 08/04/2010

sexta-feira, 2 de abril de 2010

Precatório 1

Revolta
Trinta sobreviventes do massacre de Eldorado do Carajás e o flanelinha Jhonny Yguison, que ficou paraplégico depois de baleado por soldado da PM em 2001, planejam ocupar os prédios do Ministério Público Estadual e do TJE para apressar a liberação do lote de precatórios depositados pelo governo no último dia 9, véspera da decretação da rolagem da dívida estadual de R$ 100 milhões por 15 anos. A ocupação dos prédios, segundo as estratégia, seria reforçada por caravana de sem-terra do sul do Pará solidários com os reclamantes.
Bloqueio
O plano de ocupação do MP e TJE começou a ser montado depois que a presidência do Judiciário acolheu, nos autos do precatório, simples petição do advogado Pojucan Tavares que bloqueou a liberação do depósito na conta do TJE, alegando que o dinheiro devia ser dividido com credores não contemplados na guia de preferência mandada pelo governo. De lá pra cá, a tramitação está parada à espera de parecer do procurador-chefe do MO, Geraldo Rocha, a pedido do presidente da corte, desembargador Rômulo Nunes.
Urgência
O avogado dos sobreviventes do massacre, Walmir Moura Brelaz, confirmou ontem a intenção dos sem-terra de ocupar os dois prédios e de arregimentar o flanelinha Jhonny Yguison para engrossar o protesto. "A paciência esgotou", diz Brelaz, para quem uma simples petição não tem força jurídica para trancar precatporios. "Nunca fomos ouvidos", reclama. Ele informa que vai tentar hoje uma audiência de emergência com Rocha e Nunes. O advogado relata o clima tenso e diz que os sem-terra só esperam até segunda-feira.
Diário do Pará, RD, 31/03/2010

Precatório 2

Prestígio

O advogado Pojucan Tavares está interpelando criminalmente o advogado Walmir Brelaz sobre informações formuladas no RD de anteontem onde é sugerida suposta exploração de prestígio junto à presidência do Tribunal de Justiça. “Brelaz insinuou, maliciosamente, que Pojucan havia, por simples petitório, conseguido o bloqueio da deliberação de depósito que o Governo do Estado destinara ao pagamento dos depósitos da administração direta, onde estão incluídos os sem-terra” diz em nota o advogado Pojucan Tavares.

Diário do Pará, 02/04/2010